Sangue

Qual ancestral vive através de mim?
Eu não posso viver ao mesmo tempo
Com a minha cabeça e o meu corpo
Por isso não consigo ser uma só pessoa
Sou capaz de sentir infinitas coisas ao mesmo tempo
O grande mal de nosso tempo é não haver grandes mestres
A estrada do nosso coração está coberta de sombras.
Devemos ouvir as vozes que parecem inúteis
E que no cérebro cheio de coisas aprendidas na escola,
No asfalto e na prática assistencial
E com o zumbido dos insetos que entram na minha orelha
Precisamos encher os olhos e as orelhas daquelas coisas que existem
No início de um grande sonho
Todos devem gritar que construiremos uma pirâmide
Não importa se não a construiremos!
O que importa é alimentar desejos
Temos que tirar alma de todas as partes
Como se fosse um lençol que cobre o infinito
Para o mundo ir em frente devemos dar as mãos
Misturar os assim chamados sãos, com os que são chamados doentes
E vocês, sãos, o que significa a sua saúde?
Todos os olhos do mundo vêem o precipício em que estamos caindo.
A liberdade é inútil se não tem coragem de olhar com os olhos da cara
E de comer conosco, e de beber conosco, e dormir conosco
Os assim chamados são foram os que conduziram o mundo para a catástrofe
Homem, escute!
Em você, água, fogo e depois cinzas.
Os ossos e as cinzas!
Onde estão, quando não estão na realidade e nem na minha imaginação.
Faço um novo pacto com o mundo
Que haja sol à noite e que neve em agosto
As coisas grandes acabam
Só as coisas pequenas ficarão
A sociedade deve se unir novamente e não continuar fragmentada.
Vamos observar a natureza, pois a vida é simples e devemos voltar ao começo.
Ao ponto onde pegaram o caminho errado
Devemos voltar as bases principais da vida sem sujar as águas
Que raio de mundo é esse se um louco
Lhes diz que devo envergonhar-me!
Oh, mãe!
O ar é aquela coisa rápida que gira em torno da cabeça.
E se torna ainda mais clara quando você ri.

Andrei Tarkoviski
[Filme: Nostalgia]

* Este texto recebi de Ângela Castelo Branco, numa "prática assistencial".